O Miúdinho

De repente me vem a mente uma boa lembrança de quando criança lá em Cisneiros, infância pobre, mas feliz e repleta de sonhos. Sentia saudades sem saber o por que, afinal eu com 7,8 anos sentir saudades? Talvez seria desejos e vontades e ia vivenciando as partidas e chegadas dos trens da REDE FERROVIÁRIA FEDERAL. Meu pai trabalhva na estação e a vida seguia com muita luta e honestidade.

Comecei a estudar no Grupo Escolar São José bem na rua debaixo da linha do trem. Nós moravámos numa casa simples, fria, com janelas grandes, quartos enormes e com cercas de bambú - onde meu pai gostava de ter galinhas, patos, gansos que acabavam na panela e servia como sustento a mim e aos outros irmãos - que alugavam aos ferroviários e já descontavam no salários deles.

Ali comecei a aprender o ABC e já batia a minha bolinha. Sempre gostei de futebol e às vezes os tricolores, botafoguenses e vascaínos persuadiam para que eu torcesse para estes times. Até que tive e ainda tenho simpatias por estes clubes do Rio de Janeiro, capital mais próxima que Belo Horizonte, de onde vivíamos.

Havia uma família com melhor poder aquisitivo que os outros e acabei por conhecer o Marcial. Um garoto esperto,inteligente e já também meio culto, afinal seus pais eram pessoas com mais recursos, embora o pai também fosse ferroviário, mas era o chefe e havia sido transferido para comandar a estação de Cisneiros.Havia estudado no Rio de Janeiro em bons colégios e preparado para a função. Um pessoal muito calmo e gentis mas o Marcial, acabei o apelidando de Miúdinho, pois era pequeninho, com sardas nos rosto, meio gordinho e o dono da bola. Literalmente o dono da bola, pois os tios vinham visitá-lo e trazia PELOTAS de couro como presente.

Foi a primeira vez que vi uma bola, num Natal que eu e minha irmã inventamos de colocar o sapatinho velho e furado na janela, pois esperavámos fielmente que o Papai Noel passasse e traria presentes, afinal as crianças quase todas ganhavam presentes e nosso pai só nos dava goiabada e queijo em nosso Aniversário e Natal!!!

Passou a noite e no outro dia, só decepção! Lembro-me que minha irmã chorava copiosamente, pois a boneca que sonhava não estava no sapatinho; saí prá rua em frente de casa prá ver os velocipedes, bicicletas e brinquedos que os outros ganhavam.

De repente uma turma de meninos se formou e fomos bater bola em frente de casa, na rua onde fazíamos de nosso campinho, nossa diversão diária ingênua e amistosa.

Ao terminar a peladinha, o MIÚDO - (termo que os Portugueses trouxeram para o Brasil e muito usado naquela época ) me presenteou com a pelota. Fiquei radiante de felicidade, emocionado, senti-me importante, afinal o Marialvo, tio dele havia lhe dado outra novinha em folha e ele de bom coração e generoso deu-me o primeiro presente de minha vida. Talvez o segundo, pois o primeiro foi a minha vida.

Mas, horas depois, brincando com o meu irmão a bola caiu em frente a casa de um velho rabugento que não gostava de meu pai ou de minha família, pegou a pelota e furou. Rasgou e jogou na minha cara. Foi frustante e um golpe durissímo, afinal era a minha prenda de Natal, a única coisa que ganhara na vida.

Tive dias amargos e tristes, mas o MIÚDO me levava para frente da tua bela casa, a mais bonita de Cisneiros e ali perto da venda do Sr. Jamil Salum a gente divertia sob o olhar, ora da mãe, ora do pai dele. Foi um amiguinho bem especial que nunca mais o vi, mas não o esqueci. Recordo-o ainda menino daquele jeitinho especial dele.

Acabamos mudando para Manhuaçú, depois Coronel Fabriciano e até que vim para BH. Rodei mundo,mas sempre me vem em mente algumas especiais pessoas e que estão marcada no coração, no peito, na alma, na mente com toda ternura que alguém possa sentir.

A partir dali começei a entender o bem e o mal, aprendi a ser honesto com meus pais, com a influência de pessoas bondosas, simples e trabalhadoras.

Aprendi a torcer para o Atlético...mas aí é outra história que um dia revelo a voces.

Grande abraço e que essa lembrança e saudade do Marcial possa servir de estímulo a todos a aprenderem a recordar o passado e valorizar a amizade que jamais morre,quando se gosta de verdade.

Belo Horizonte, 19 de junho de 2009
Guto de Moura

Visitem o blog do Guto: guttogallo-atleticano.blogspot.com

Comentários

Anônimo disse…
AMIGO..
OBRIGADO POR PUBLICAR MEU RELATO..
TEI BLOG CONTUNUA SENSACIONAL
VALEU

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